sábado, 25 de setembro de 2010

"O que há em mim é sobretudo cansaço"


O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.

A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas -
Essas e o que faz falta nelas eternamente -;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.

Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada -
Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...

E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço...


(Indiscutivelmente, de...) Fernando Pessoa


quarta-feira, 22 de setembro de 2010

(Boa) Noite


E quando a (boa) noite grita...

Mais forte que as tempestades dos mares do norte
Grita ao ouvido que, colocando-se em posição infortunadamente inclinada, escuta...
O grito...
da (boa) noite...
Aquela, que por ser tão forte na sua magnitude...
Apazigua a alma, de sua doce e frágil paz.
Não lhe abras a porta.
O frio fá-la boa...
O frio fá-la ser. Apenas ser.
Acontecer sem a veres.

"Retrato em Preto e Branco"


É mágoa

Já vou dizendo de antemão
Se eu encontrar com você
'Tou com três pedras na mão
Eu só queria distância da nossa distância
Saí por aí procurando uma contra mão

Acabei chegando na sua rua
Na dúvida qual era a sua janela
Lembrei que era p'ra cada um ficar na sua
Mas é que até a minha solidão 'tava na dela

Atirei uma pedra na sua janela
E logo correndo me arrependi
Foi o medo de te acertar
Mas era p'ra te acertar
E disso eu quase me esqueci

Atirei outra pedra na sua janela
Uma que não fez o menor ruído
Não quebrou, não rachou, não deu em nada
E eu pensei: talvez você tenha me esquecido

Eu só não consegui foi te acertar o coração
Porque eu já era o alvo
De tanto que eu tinha sofrido
Aí nem precisava mais de pedra
Minha raiva quase trespassa
A espessura do seu vidro

É mágoa
O que eu choro é água com sal
Se der um vento é maremoto
Se eu for embora não sou mais eu
Água de torneira não volta
E eu vou embora
Adeus



Mágoa, de Ana Carolina

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Oh little Vincent


I would like to be Vincent Malloy
With a grim face and a zombie dog
Would like to be dreaming
Wandering in the fog
Nobody around me
I like to be alone
Nobody disturbs me
I could change them in stone

If only I were Vincent Malloy
With Vincent price deep voice
Walking among the grave
And quoting Allan Poe
Thinking it's my last eve
Nobody seems to know
But why should I worry?
For life is just nothing
And I want more of death
It is the real deal

I wish I were Vincent Malloy
With zombie dog and living doll
Nobody's beside me
My love have been buried
I'm searching for her under the mournful grind
I'm searching for fear inside my so dark dreams
I'll never get back from this freaky travel
When nightmares are too dark
There is no more marvel

I would like to be Vincent Malloy
For he had a wax museum
Playing with death
Instead of toy
With his own truth
And his own laws
He was an amazing person

I would have liked to meet Vincent Malloy
Telling him not to trick with ghouls
It is a game for mindless fools
And warning him against morbid
For it can only lead to scream
Telling him
As his mother said
Go outside and play
It's a beautiful day

I would have liked to be Vincent Malloy
Would have liked too feel like this crazy boy
Living in his own universe
Talking only in verse
But his soul is now a jail
And his dreams are like chains
Vincent died instead of playing
And he cried instead of laughing
It's sunny outside
And a beautiful day
If you want to be dark
There is a price to pay


By pleur-de-lys

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

:






"Entre os dentes, segura a primavera.
"

Do lado de cá

Se quisesses, fazias.
Se quisesses, voltavas.
Se quisesses, tinhas visto bem mais do que a tua imaginação construiu sozinha.
Eu estive à espera. Por imensas ruas, becos e praças.
Mas tu nunca estiveste lá.

Se pudesses querer, não terias suportado a debilidade.
Leva-a então contigo, e se fizeres dela algo absolutamente teu, possivelmente orgulhar-me-ei.

Que para o que demais disseste sem saberes verdadeiramente porquê, estou-me bem a lixar.

Fica, eventualmente, com este lugar-comum.

domingo, 19 de setembro de 2010

Lateral

Nem tudo o que brilha é ouro. E nem todos os que procuram brilho querem ouro.

É assim, certo?

Ah... espera....

Um dia disserto brevemente sobre a vastidão de minas no mundo, quando o assunto for menos mediático.


E nada mudou, e a história volta a girar, noutra cidade!

É.

Beatriz - Tom Jobim

(Corda-Cordel)


A milhentos mil passos...custa muito mais saber não sentires.
A milhentos mil passos...sei não saber-te pelo simples facto de não me saberes.
Quando alguém, que nunca tem e se habituou a não ter, recebe finalmente um presente num qualquer dia vulgar, esquece-se de lhe tomar o gosto.
Tece um mecanismo de funções e opiniões de gente e vultos que não interessam, e solta-o em cascata sem o sentir escorrer na pele..., nas linhas entre o coração e os pulmões. Entre mim e ti.
Estava sozinha, calada pela angústia do silêncio.
Sozinha, pousada ao teu lado! Não desculparia em mim tal engano! Este.
Chorei, bem para além de tudo o que me constitui.
Foi isso que fizeste.
Nada traduziste. Gaguejaste vulgaridade e ignorância.
A milhentos mil passos...seria menos doloroso desculpar-te a falha acéfala e grosseira de uma mente já incapaz de ousar. Incapaz de ser impiedosamente suave.
A milhentos mil passos...Uma montanha de linhas velhas e cotão escuro de coisas que não interessam. De coisas perdidas. De corpos insípidos sobre o teu corpo desalmado. De razões só tuas numa poltrona velha e arrumada no breu.
Já nada é teu. Se calhar nunca foi.
Não sei.
E eu?
A milhentos mil passos da ideia do vazio...
Podia dizer que era da lancinante falta que te sinto infinitamente todas as noites.
Todas as vezes que abro a janela já de dia.
Todas as vezes que vejo pessoas.
Todas as vezes que sinto o cheiro da chuva e de rochas molhadas pelo rio.
Todas as vezes que paro.
De todas as vezes que ouço em mim a alusão ao som de campainha de porta.
De cada vez que uso a sarcástica verdade em mim.
De todas as vezes que sinto o meu torso, desprovido do que não me deixaram ter e mostrar...
De todas essas vezes que não soubeste...
E que eu não andei. Rija.
Podia dizer
Mas nem o dom do sofrimento me beijaste
A tua inexistência completa, o meu asilo.
E agora sinto-me antiga de um reino que nunca existiu. E onde afinal, eu nunca estive, nunca governei, e onde ninguém me viu por engano de sensatez.
Que posso eu dizer?
Que posso eu dizer?!
Se eu não vim de lado nenhum, e sofro por motivos que a razão desconhece...
Resta-me dormir em chão de terra.
Um qualquer.
Sujo, húmido e verdadeiro.
Sentir-me finalmente sentir.
A milhentos mil passos do que julgam agora saber de mim.

A milhentos mil passos... continuarei a sentir uma lança aguçada e invisível a atravessar-me o peito.

E poderei então fingir-me saudável.
Se acaso chegar.
E deixar-te ao acaso da minha memória traidora.

...Essa majestosa e bela besta traidora.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

*

Apetece-me pedir desculpas informais a mim própria, e comer a tablete de chocolate preto e champagne, que comprei para alguém, sob forma de atenuar a minha falha..., um destes dias, naquele cantinho doce do Chiado...

E é só.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

De tão perto


Qual a verdade clínica do Carnaval humano?
É tão ardilosa quanto a mentira.
Porque é viciada na verdade constituinte de cada máscara.

A frieza da vitoriosa ordem do cortejo da vida, é um diagrama.

Existe então subtileza na verdade?

Existe limite ou centro?
Qual a ténue linha separatriz?
Não que a deseje...

Mas tenciono saber-lhe a distância certa.

Seja qual for o lado da infelicidade que escolher. Que conseguir.
Vive feliz quem vive a realidade.
Quem carrega o fardo assumido das mãos sujas.

Os infelizes, que são infelizes porque se magoam com prazer...

Querem a constante ilusão de felicidade.

Qual é a ténue linha separatriz?

Não que a deseje...

Mas tenciono saber-lhe a distância certa...

A distância certa da cobardia.


Porque afinal...
A verdade é o maior engano da alma.

Irrefutável dor sem terapia.



Imagem em Deviantart

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

Uma questão de...


Prefixo , ... , Sufixo.

A gramática é mais justificativa que a matemática.


Mas nenhuma me diverte o suficiente.

A respeito da gramática das coisas...

Sinto o fedor nauseabundo das casas novas e cheias de gente. Dos cafés de mesas cheias de gente perfumada a fumar. Dos bolos de cerejas cristalizadas no topo. Sinto o odor agonizante de Setembro como mais um mês sem nome. Odor esse que seca o céu da boca. Sinto o cristal da bola que carrego por entre as minhas mãos, cortar-me a verdade em pedaços simétricos. Guardo todos os estilhaços delicadamente no bolso cosido na roda da minha saia. E uso do seu brilho nos gestos desritmados dos meus membros, sempre que me sento em multidões. Entretenho fiapos do mundo com brilho das luzes das suas próprias estradas... E volto para lá. Bem longe. Bem longe, perto do vosso intervalo. Vivo para vos satisfazer com rispidez, a elegância. E todos os dias faço caso do conforto de convivermos assim. A vida.
Ser uma iludida de prefixo no nome. De antecipação da fatalidade.
Do sufixo trago-vos o gosto. Que mente. A quase toda a hora.