segunda-feira, 31 de maio de 2010

Eu sou melhor que você

Deixa-me rir..., quase tão embriagada quanto o Jorge Palma..., de lucidez.


Todo mundo acha que pode, acha que é pop, acha que é poeta
Todo mundo tem razão, sempre vence e na hora certa
Todo mundo prova sempre p'ra si mesmo que não há derrota
Todo homem tem voz grossa e tem pau grande,
Que é maior do que o meu, do que o seu, do que o de todos nós!
Todo mundo é referência e se compara só p'ra ver quem é melhor
Todo mundo é mais bonito do que eu, mas eu sou mais que todos
Todo mundo tem swing, é forte, é feliz e sabe sambar
Todos querem, mas não podem admitir a coexistência do orgulho e do amor, porque
Eu sou melhor do que você !
Mas, por favor, fique comigo que eu não tenho mais ninguém...
Todo mundo diz que sabe e quando diz que não sabe é porque
É charmoso não saber algo que todo mundo já sabe como é.
Porque todo mundo é original, é especial, é o que todos queriam ser
Não basta ser inteligente, tem que ser mais do que o outro p'ra ele te reconhecer.
Porque...
Todo mundo ganha grana só p'ra dizer que ela não vale nada
Todo mundo diz que é contra a violência e sempre dá porrada
Todos querem se apaixonar sem se arriscar, sem se expor, nem sofrer
Todas querem vida fácil sem ser puta, e com reputação se reprimem e começam a dizer
Eu sou melhor do que você!
Mas, por favor, fique comigo que eu não tenho mais ninguém...

sexta-feira, 28 de maio de 2010

A mentira da verdade... Essa fatalidade.


Sem beleza.
O amor é bem mais venenoso que o ódio, o rancor, ou até a vingança. Diz quem não sabe. Digo eu.

É a traição por excelência quando não é opção.
E afinal tudo é opção a partir do momento em que cedemos a uma qualquer tentação. Seja ela assombrosa, capricho, ou mera fraqueza interior. Seja ela todas as hipóteses anteriores.
Saber distingui-las ao mesmo tempo que se vive no mundo em lista de espera, é sermos impiedosamente atirados, um a um, para o poço negro de lama de excrementos podres.
O poço das prioridades. O poço do limite da autenticidade. O poço da felicidade hipócrita.
Após o pânico de tal armadilha integral, a adrenalina retorcida da queda livre. E de novo o pânico... E depois a dor... E depois o odor e o medo... E depois a consciência vazia de todos eles.. Já no fundo, onde ainda entram tímidos raios de Sol.
Andamos, assim, às cegas entre o tacto e o fedor que nos sufoca o olfacto. De cócoras em busca da melodia da estabilidade, como animais perdidos de instinto. Figuras ridículas e cabisbaixas à brisa agreste da superfície.
Há quem procure o amor sem saber como. Como quem levanta ao acaso copos todos iguais invertidos sobre uma mesa, em busca do brinde escondido. E simplesmente lhe perca ao sentido.
Há quem nada procure, e não sabe quando encontra.
Há quem tenha medo.
Há quem fuja e se refugie na ambiguidade de uma filosofia de vida.
Há encontre e tenha a coragem e a iniquidade suficientes para o deixar escapar por entre os dedos.
Como a água que não se deixa empunhar, nada é nosso. Nada nos pertence.
E ainda assim mantemos ao longo de uma vida inteira uma série de coisas que acreditamos querer. Poder ter.
Mentirosos pela mesma máxima: a felicidade!
Uma velha beata de cigarro num cinzeiro inquinado ao meu lado, dir-me-á bem mais que se me escreverem em tinta delicada as palavras amor e felicidade.
Tomo a coragem de amar a hipótese, e quando quase tudo parece florescer ao som do sucesso..., de novo o galo dos pontos cardeais do meu telhado cede ao estado do tempo.
E vem a tentação. O novo desconhecido. A ameaça da paixão. E do mais e maior que eu.
Quem me julgo para poder magoar-me assim?
Para puder magoar-te?
Quem me julgo, no entanto, para resistir ao apetite do que me rodeia?
Eu quero ser arrogantemente maior do que posso!
Ingenuamente de distantes e difusos horizontes!
A contradição do que quero e que nunca será meu!
Quero não ter. Quero provar. Porque só assim saberei dizer-vos a minha paz. (Só?)
E se um dia, mais tarde, me voltarem a perguntar:
Porque falas assim comigo?!
Eu finalmente saberei responder com um silêncio inteiro. Certo de serenidade.
E sorrirei com os olhos brilhantes de sabedoria e mágoa, pares.

E assim sendo, quanto a agora, de cócoras no escuro procuro, no meio de fezes e fedor, a hipocrisia da dignidade coesa.

Perdoa-me.
Perdoa-me fielmente.
Que o papel do julgamento permanecerá intacto.

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Descarto à Memória

Como dizer que já pintei as portadas da janela do quarto, e que agora já não dá para ficar?
Pintei-as às cores, sem que isso se traduzisse nos tons serenos e pesados da minha alma.
Fechei a janela, e tapei aquele poço de sombra e cheiro nauseante a retrete.
Quando ao princípio da tarde bati com a porta da rua, rumo apenas à calçada, mais uma vez atrasada para tudo o que me pudesse esperar..., apercebi-me de que se fazia Sol outra vez.
Sabia que era outra vez sem ter sentido o do dia anterior. Mas se assim era, provavelmente no dia seguinte fazer-se-ia de novo Sol.
Quem se rala?
Respirei fundo, sem sentir arquear o diafragma com gosto, e tentei focar o fundo da rua, aquando os meus passos desritmados avançavam.

Na esplanada do café em frente à grande fonte, ouviam-se os pombos que passeavam no chão, rondando os pés dos que bebiam o gelo do fundo dos copos lentamente, em busca de restos de conversa que ficou antes calada ou despercebida entre migalhas.
Sem parar, assobiei num esgar desabituado de lábios, e cumpri a melodia das coisas imutáveis. Dos prantos planeados e intuitivos. Da contradição dos meus dias perante a vida maior que eu.
Dos desacertos fiéis.
Estava de novo a caminho das insónias doentias das madrugadas. Costume, rumo à injusta genuinidade que me fez parar, desde que me lembro de ter crescido, naquele dia que digo que ainda não conheci.