quinta-feira, 17 de junho de 2010

O cantar do cuco.


O Sol raia cedo. Hoje esperei que ele chegasse ainda no escuro do meu quarto.

Agora completamente desperta e de olhos bem abertos.
São sete da manhã e já me deitei, e já dormi, e já sonhei, e já acordei.
Ontem mais do que nunca, senti esta necessidade aflorar desesperada, a suar, dentro de mim.
A mais que a obrigação de um dia útil. A mais que quem me quer bem.
Porque sinto-me viver assim. E só assim.
A vontade aplacada de sentir os dias e as noites passarem pela minha madeixa de cabelo despenteada.
Sem isso não tenho nada. O cansaço da vitória percorre como um vulcão em erupção as veias e artérias... Explode no coração. Irriga o cérebro e deixa-me descansar o corpo ao acaso na horizontal.
Não tenho botão on/off. E todos os dias, quase que isso se avizinha como um problema. Como o problema.
Sofro de anestesia natural. Cessa o meu corpo e a minha vontade em sobredoses prazerosas.
Mata-me ao mesmo tempo que me faz vida nervosa.

É assim. Acordar com a certeza de que a paixão se encontra nas vísceras da incerteza.
Que o desejo doloroso e mais fogoso, se encontra na fugacidade de um beijo que carrega e que parte.
Amarga admiração. Doce tentação.
A recordação é certamente mais pesada que o presente.
A minha maior dor não passou. E sinto-me incapacitada de me surpreender com o que vejo, vi e chorei.
O que senti, naquele ano, sentada ao seu lado, sozinha, no meio da ampla plateia do teatro, à luz daquele filme coreano..., é o mesmo que sei agora aqui sentada a ouvir a água do chuveiro a correr.
E de nada vale deixar de amar o que o tempo me deu envolto em laço de veludo.
Sei ser-te inteira ainda que chorando.
Sei guardar a alma ainda que ta espelhe.
Sei sentir-te ainda que lamente.
Sei as linhas da paixão, ainda que tenha perdido.
Só não sei ter-te. Porque o que quero é sempre a mais do que posso.
Tudo o que amo é único. E tudo o que é único não tenho como amar.
Deixa-me ver-te à distância suficiente, para ver o tamanho da tua sombra.
Aqui, sob o Sol.

São sete da manhã..., e agora que o Sol já raiou, vou fechar os olhos de novo.


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