terça-feira, 9 de novembro de 2010

P de...

Como se me arrancassem cada bocado meu que ainda nem sequer tive o prazer de conhecer.
Que ainda não moldei para dar. Dar assim. De braços abertos, vénia sob o foco de luz branco. Sobre o ilimitado palco negro.
Como a pantera aprisionada pasmosamente no interior de um dado viciado de ferro ferrugento.
Como se não pudesse mais ponderar lutar contra a languidez completa da fortaleza construída antes de mim. Como se não quisesse mesmo, sem precisar. De tão completa injuriosa, misericordiosa, pestilenta, drogada película que perfaz a verdade em sólidos disformes. Sólidos de exactidão!
Agora vendida.
Eu, vendida sem mini-saia.
Eu, puta.
Eu, puta que não se insinua.
Eu, puta que ao de leve, roço o rosto até à ponta do queixo na parede cheia de fuligem. E espreito de esguelha, com um só olho borratado de rimel o fim da rua à noite, no cruzar da esquina. Sem aragem gelada.
Eu puta, que lustro da cinta até ao rabo incisivamente, no ângulo recto dos caminhos que se cruzam perpendiculares na noite feia.
Em mais uma noite igual.
Pedes, faço.
Sem jeito e sem qualquer apreço ou respeito pelo cumprimento regular.
Rompo-vos o látex, lambo-vos erecto o mandato.
Falo... Falo sem língua, que bem agitada guardo no canto da boca.
E gemo-vos, então, em voz rouca e matematicamente segredada, sempre antes.
E precisando o antes...
Antes de se virem.
Antes de me saber vir... até à luz morta do sol do dia. Até esta, preguiçosa, voltar a raiar nos umbrais.
Como se me arrancassem, mordazes, o cabelo num cabaret despido de tusa e glamour. Triste.

Porém, ao ouvir-me de novo o baque seco do tacão no cimento repleto de beatas..., já a caminho de casa, eu... puta, volto a tirar a peruca.

E, então aí, a luz da lua já alta, sente-se livre para me iluminar a nuca calva e branca como a imaculada porcelana.

E sigo em frente. Eu.
Eu assim.
Puta.

Puta de mim.

2 comentários:

Anónimo disse...

Gostei =)

blackbird disse...

Não sei de quem se trata, de qualquer das maneiras, Obrigada!:)